
Alvo de denúncia na Susep, seguradora omite que opera em caráter experimental
11 de fevereiro de 2025A seguradora LTI, responsável pelos seguros vendidos pela Loovi e recentemente alvo de denúncia apresentada pela Federação Nacional de Corretores (Fenacor) à Superintendência de Seguros Privados (Susep), não deixa claro em seu site ou redes sociais que atua em ambiente regulatório experimental (Sandbox Regulatório) e com uma autorização de funcionamento temporária, que vence em fevereiro de 2026. Essa divulgação é uma das principais regras que devem ser seguidas pelas companhias que são selecionadas para participar desse ambiente, segundo fontes que já participaram do processo.
O sandbox foi criado pela Susep para fomentar o desenvolvimento de projetos inovadores no setor segurador, e está em sua terceira edição. A regulação do programa foi criada de forma a permitir que as empresas desenvolvam projetos com condições especiais e menos exigências regulatórias, mas considerando também a proteção dos consumidores.
A Resolução CNSP Nº 381 de 2020, que estabelece as condições para autorização e funcionamento das sociedades seguradoras participantes, prevê a obrigação de “apresentar a seus clientes o conceito de Sandbox Regulatório” e efetuar a oferta, promoção e divulgação de produtos e serviços de forma clara, adequada e minimizando a possibilidade de má compreensão por parte do cliente.
Conforme o texto, as informações prestadas pela sociedade seguradora participante do sandbox devem ser divulgadas e mantidas atualizadas em local visível e formato legível no site, aplicativo ou outras redes de comunicação, possuir linguagem clara e objetiva, de forma a permitir ampla compreensão sobre os incorridos e sobre o caráter temporário e experimental do projeto inovador, além de constar dos contratos, dos materiais de propaganda e de publicidade e dos demais documentos que se destinem aos clientes.
A LTI, sediada em Minas Gerais, foi selecionada na segunda edição do sandbox com um projeto voltado ao seguro de automóveis, com autorização para funcionar entre 2023 e 2026. Segundo as informações que constam em seu site, a venda dos produtos é feita pela Loovi. Ambas pertencem ao empresário Quézide Salgado Cunha. Tanto no site da seguradora quanto de sua representante de vendas não há informações explícitas sobre o sandbox.
No fim do site da LTI, consta o número do processo na Susep. Em uma busca pelo número, é possível encontrar a portaria 8091, de 13 de janeiro de 2023, em que consta a informação sobre a autorização para operar seguros de danos, pelo tempo determinado de 36 meses em ambiente regulatório experimental. Já no site da Loovi, a empresa se apresenta, também na parte inferior da página, como “insurtech que distribui seguros automotivos através de sua plataforma integrada com corretores, executivos de vendas e seus canais digitais, sendo representante de vendas da seguradora LTI Seguros S/A (SUSEP n.º 15414.649321/2021-55)”.
Em uma seção específica, de perguntas frequentes, o questionamento “Como encontrar a Loovi na Susep?” é respondido com: “Para identificar a Loovi na SUSEP, basta acessar o site: SUSEP. Estamos lá com o nome LTI Seguros S.A”. O link que aparece o nome da Susep direciona para a página “Seguradoras Participantes do Sandbox”, mas não há informações sobre a participação.
Além da LTI, outras cinco empresas participam ou participaram da segunda edição do sandbox na modalidade “seguro auto passeio”. Destas, duas já obtiveram a licença definitiva. As demais (Neo, Novo e Oon Digital) citam em seus sites o fato de serem participantes do sandbox, conforme as regras do programa, ainda que o nível de explicação varie de caso a caso.
A Novo informa que é “uma seguradora com autorização temporária concedida junto a SUSEP no processo nº 15414.617730/2023-54, participante do Sandbox Regulatório da 2ª edição, com o código de registro 110484”. A Neo diz na página “Quem Somos” que “nasceu após sua aprovação na 2ª edição do SandBox Regulatório da SUSEP Superintendência de Seguros Privados, sendo a única insurtech autorizada a comercializar seguros de forma totalmente digital para 3 verticais: seguro auto, seguro de eletrônicos e seguro pet”. Já a Oon Digital responde, também na seção de “Perguntas Frequentes” a questão “Esse modelo de seguro é regulamentado pela Susep?” com: “Sim! Não só somos regulamentados como fazemos parte da Segunda Edição do projeto regulatório de inovação da Susep, o Sandbox!” e inclui um link para página do sandbox, caso o cliente queira saber mais.
A LTI foi questionada sobre a falta de informações sobre o sandbox em sua página, mas não retornou o contato até a publicação da reportagem.
No dia 28 de janeiro, a Federação Nacional de Corretoras de Seguros Privados e Resseguros (Fenacor) apresentou uma denúncia à Susep contra a LTI e contra a Loovi. A entidade pede que a autarquia investigue as empresas e, até que tome uma decisão, suspenda a venda de produtos. A alegação é a de que a Loovi se apresenta aos consumidores como se fosse uma seguradora, sem ter o registro para isso. Conforme a entidade, ocorre, com isso, uma “massiva propaganda enganosa” baseada na “confusão proposital” entre a Loovi e a LTI, que participa do sandbox.
“A Loovi não é autorizada a funcionar pela Susep como sociedade seguradora, o que gera desinformação proposital ao se apresentar nessa condição. Trata-se de uma representante de seguros, com possível atuação como sociedade seguradora sem autorização da Susep”, diz a Fenacor em nota.
A Loovi oferece aos clientes coberturas com pagamento mês a mês, sem análise de perfil do condutor (“não importamos com quem vai dirigir e nem onde mora, o valor não muda”) e proteção para carros fabricados a partir de 1986, incluindo até os modificados e comprados via leilão. A promessa é de seguros “50% mais baratos” com aprovação digital em até cinco minutos, sem necessidade de perícia.
A estratégia de marketing da empresa é baseada em propagandas feitas por nomes do esporte e influenciadores como Renato Cariani e Whinderson Nunes. “Eles pegam qualquer tipo de carro. Para vocês terem uma ideia, nem análise de perfil eles fazem”, diz Whinderson em um vídeo compartilhado no site da representante de vendas.
No início deste mês, em meio ao retorno de Neymar ao Santos FC, a companhia se tornou patrocinadora oficial do time de futebol. A marca da empresa ficará estampada nos números das camisas dos jogadores da equipe profissional masculina, feminina e categorias de base, com um contrato válido por dois anos.
Conforme a Fenacor, como não é uma seguradora, a Loovi não poderia prometer coberturas específicas, como aceitar carros rebaixados. A entidade também cita a realização de um sorteio pela empresa neste ano, tendo como prêmio “um ano de seguro grátis”, sem que para isso fosse informado o número de registro e de autorização da Secretaria de Prêmios e e Apostas (SPA) do Ministério da Fazenda.
Questionada sobre o conteúdo da denúncia, a Loovi não enviou pedido de posicionamento até esta publicação.
Outro ponto questionado pela Fenacor é a participação de Pablo Marçal nas empresas. Em vídeos nas redes sociais, o empresário se apresenta como dono ou sócio da Loovi. Conforme a Fenacor, não há informações na documentação das empresas sobre a participação de Marçal, o que poderia infringir regras do mercado segurador.
Em um vídeo no perfil oficial da Loovi no TikTok, Marçal aparece em um vídeo com título “Dono de seguradora fala por que comprou a Seguradora Loovi”. Ele afirma: “A gente só comprou por causa da tecnologia. Ela se chama Loovi, a seguradora que não pega a placa do carro e você não precisa pagar. A gente segura em três minutos”.
Procurado pelo Valor, Marçal disse, por meio de nota: “Sou investidor, e não sócio da empresa, assim como em dezenas de outras companhias. A Loovi é uma insurance e a LTI é da mesma holding. Não existe irregularidade nenhuma”.
A Susep disse que “no caso de recebimento de denúncias, atua em conformidade com a legislação vigente” e que “após o recebimento da denúncia e a conclusão da instrução do processo administrativo, em que são garantidos de maneira ampla o direito de defesa e do contraditório, a administração dispõe de até 30 dias para decidir, salvo prorrogação por igual período, devidamente motivada”.
Fonte: Valor Econômico