Artigo: O seguro e a estupidez sem limite
2 de setembro de 2024Por Antonio Penteado Mendonça*
Gostaria de saber o que leva um imbecil a tacar fogo de propósito na vegetação seca por causa da estiagem que atinge grande parte do Brasil. Foi isso que aconteceu em São Paulo e acontece por todo o país. Da Serra do Cipó ao Pantanal, no interior paulista e em Minas Gerais, matas, campos, lavouras e pastagens queimam fora de controle em incêndios acelerados pelo vento. Boa parte deles, criminosos. Fogo deliberadamente iniciado pelo ser humano. Não uma bituca de cigarro jogada pela janela, mas incêndio proposital, com o auxílio de material inflamável espalhado no pedaço e aceso para queimar tudo, num fogaréu fora de controle.
Alguns suspeitos foram presos em São Paulo, mas, pela dimensão da tragédia, tem mais gente envolvida. A polícia tem que apurar e prender esses criminosos que, além de causarem prejuízos incomensuráveis ao meio ambiente e a empresas agrícolas, mataram pelo menos dois funcionários de uma usina de açúcar, que morreram combatendo as chamas.
Voltando ao começo, gostaria de saber o que leva um imbecil a cometer um crime dessa natureza. Qual o seu objetivo, o seu lucro, o porquê de uma ação com esse grau de estupidez? Temos diferentes versões, desde crimes orquestrados até atos isolados. E com diferentes finalidades, de desmatamento para criar novas pastagens à tentativa de comprometer a imagem do Brasil na reunião do clima que acontece no ano que vem em Belém do Pará.
O fato é que o fogo destruiu mais de 20 mil hectares no Estado de São Paulo, a maioria plantada com cana de açúcar, e os prejuízos devem ultrapassar com folga a casa de um bilhão de reais. E os danos no resto do país, inclusive em áreas de campo e matas nativas, além de outras propriedades agrícolas de todos os tamanhos, também são relevantes. Este é um dado dramático: não foram apenas grandes empresas que foram atingidas. Agricultores familiares também perderam lavouras e animais em função do fogo que varre boa parte das regiões sudeste e centro-oeste do país.
Supondo que a estupidez tenha fundo ideológico e tenha gente interessada em causar prejuízos às grandes empesas agropecuárias, o que leva esses imbecis a atearem fogo em reservas e parques naturais e, de quebra, destruírem as propriedades e comprometerem o futuro de pequenos produtores?
O seguro rural tem cobertura para os danos causados pelo fogo. Os governos federal e paulista têm programas de subsídio para baratear o custo do seguro rural e aumentar sua abrangência, mas ambos são insuficientes para fazer frente às reais necessidades de proteção dos agricultores. Vale dizer, dificilmente a maioria das propriedades atingidas pelas chamas receberá algum tipo de indenização de seguro e contar com o auxílio do governo nem sempre é a certeza do ressarcimento. Quanto às matas, campos, reservas e parques, estes dependerão apenas de sua capacidade de regeneração natural.
Como esse cenário deve se repetir ao longo dos próximos anos, é fundamental as autoridades aumentarem os subsídios para o seguro rural. Sem eles, os prejuízos poderão comprometer parte do agronegócio nacional.
* Antonio Penteado Mendonça é escritor, advogado sócio da Penteado Mendonça e Char, formado pela USP, com especialização em Direito Ambiental pelo DSE, na Alemanha, e em Seguros pela FGV-Fundação Getúlio Vargas, em São Paulo. Também é professor, palestrante, escritor e ex-presidente da Academia Paulista de Letras.