Por Antonio Penteado Mendonça*
O governo brasileiro está longe de ser competente, ou pelo menos minimamente competente, no trato da coisa pública. Em nome do populismo e da reeleição do presidente, a situação fiscal vai ficando cada dia mais complicada e a forma encontrada para contrabalançar a crise é simples: aumento de impostos e corte de verbas, mesmo com o risco das contas desandarem.
Para quem não se lembra, faz algum tempo o foco foi o aumento do IOF. O IOF (Imposto Sobre Operações Financeiras) é um imposto regulador, quer dizer, pensado para regular situações econômicas, mas foi transformado em arrecadador, ou seja, com a missão de aumentar o caixa do governo, com as bençãos do STF (Supremo Tribunal Federal), que endossou as medidas adotadas pelo executivo, depois delas terem sido rejeitadas pelo Congresso Nacional.
Entre os alvos escolhidos, a previdência complementar aberta recebeu de presente uma taxação de 5% sobre o principal para aportes acima de 600 mil reais. Vale lembrar que o VGBL já paga imposto de renda, que começa extremamente elevado para saques nos dois primeiros anos da aplicação, e vai sendo reduzido ao longo do tempo, até uma alíquota de 10% para saques depois de 10 anos.
O resultado da introdução da cobrança do IOF de 5% foi a redução de 19% na captação de investimentos, em 2025. Se em 2024 o VGBL captou 177 bilhões de reais, a projeção para 2025 é de 144 bilhões de reais.
O VGBL é o principal gerador de poupança de longo prazo do Brasil. Num país com pouca poupança, como é o nosso caso, este produto deveria ser fortemente incentivado, mas, ao contrário disso, com a aplicação do IOF sobre os aportes acima de 600 mil reais, o governo entrou de sola, quebrou a confiança do investidor e tirou qualquer incentivo para se investir nele, independentemente da quantia ficar acima ou abaixo dos 600mil reias.
Mas ao atingir o faturamento do setor de seguros, que de um crescimento de 2 dígitos em 2024, em 2025 deve ter algo próximo a 2%, se considerarmos saúde privada, e menos 3%, se os planos de saúde forem deixados de fora, o governo acabou dando um tiro no próprio pé. O setor de seguros é responsável pela aquisição entre 15% e 20% dos títulos da dívida pública federal. Ao taxar o VGBL com 5% de IOF os recursos para investimentos diminuirão, dificultando a colocação destes títulos.
O tiro no outro pé passa pelo seguro rural, ou melhor pelo subsídio do seguro rural. Uma área de 14 milhões de hectares, protegida pelo seguro rural, caiu para 7 milhões de hectares em 2024 e este ano o quadro é mais grave ainda, o número deve atingir o menor patamar da série histórica, com apenas 3 milhões de hectares segurados.
O seguro rural é em sua maior parte utilizado para proteger propriedade médias e pequenas. Ao contingenciar recursos para o seguro e reduzir a verba do subsídio de 1 bilhão para quinhentos milhões de reais, o governo está comprometendo o futuro de milhares de agricultores médios e pequenos que não terão condições de contratar a proteção que lhes garante recomeçar, se acontecer um sinistro.
Entre secos e molhados, nos dois tiros, perdem todos.
* Antonio Penteado Mendonça é escritor, advogado sócio da Penteado Mendonça e Char, formado pela USP, com especialização em Direito Ambiental pelo DSE, na Alemanha, e em Seguros pela FGV-Fundação Getúlio Vargas, em São Paulo. Também é professor, palestrante, escritor e ex-presidente da Academia Paulista de Letras.
Fonte: Estadão