Artigo: O seguro depois da pandemia
29 de junho de 2020Ninguém tem dúvida, a pandemia está longe de acabar. O Brasil não fez a lição de casa, então, o que vai acontecendo no mundo ainda vai demorar para acontecer aqui e isso terá resultados ruins para a vida da Nação. Enquanto países que tomaram as medidas impopulares necessárias para conter a velocidade do vírus começam a abrir suas portas e retomam lentamente o ritmo dos negócios, o Brasil, que nunca fechou direito as portas, assiste o vírus se espalhando pelo interior e se aproxima perigosamente de números dramáticos, tanto em pessoas infectadas como em mortes.
Estamos na casa dos 60 mil óbitos em função da covid-19, e esse número deve subir mais até o final da fase aguda da pandemia, prorrogado para fins de outubro, começo de novembro, pelos especialistas com credibilidade.
Não tem como ser diferente, já que as ruas estão lotadas, o isolamento social é obra de ficção e as pessoas parecem não se dar conta, até terem alguém próximo vitimado, de que estamos vivendo um momento dramático, fora da rotina e capaz de causar imensos danos imediatamente e outros maiores no futuro.
Não há mais muita coisa que possa ser feita para combater a pandemia. Ela se espalha pelo interior do País e, fora de controle, vai cobrar caro a imprevidência nacional e o mau exemplo que veio de cima, comprometendo as ações para o seu enfrentamento, que começaram de forma correta, mas que, sem apoio do governo federal, foram perdendo o foco até a abertura sem planejamento explodir, como aconteceu três semanas atrás.
Esse vírus tem a característica de ser previsível. Exatamente duas semanas depois dos fatos, chega a reação. Em função do que aconteceu e do que vai acontecendo País a fora, é possível dizer que entramos num momento complicado, que deve se estender pelas próximas semanas, com resultados ruins para os números da pandemia.
Se agora, de acordo com o IBGE, já temos quase 30 milhões de pessoas sem esperança de conseguir emprego, porque a economia desacelerou e um número imenso de empresas fechou, quebrou ou teve de demitir para não quebrar, as perspectivas para o resto do ano estão longe de serem otimistas e o quadro para 2021 tem tudo para continuar ruim.
Os números do primeiro trimestre não foram bons para a maioria dos setores econômicos. Mas o setor de seguros teve um desempenho razoável, fruto da atividade ter seu faturamento estendido no tempo, por vários meses, depois da contratação da apólice.
Com certeza, o segundo trimestre já não trará um quadro parecido e a tendência é que o terceiro e o quarto trimestres sejam piores. Não tem outra alternativa, na medida em que a economia deve encolher em patamares elevados, comprometendo a atividade econômica e a poupança da sociedade.
Como o patamar de entrada em 2021 será muito baixo, qualquer suspiro da economia é suficiente para se falar em crescimento. Afinal, sair de menos para alguma coisa melhor é mais fácil do que crescer quando as coisas vão bem. Isso quer dizer que em 2021 o setor de seguros deve ter um desempenho melhor do que em 2020, mas não deve se aproximar do que aconteceu em 2019.
Além disso, a pandemia trará mudanças que ainda não podem ser corretamente dimensionadas, mas que afetarão a sociedade e a economia e modificarão a forma de viver e de fazer negócios.
Várias atividades mudarão de perfil. Óleo e gás não devem retomar os patamares anteriores, nem em produção nem em preço. Isso vai ter impacto no setor de açúcar e álcool.
A indústria automobilística também não deve voltar aos patamares anteriores, comprometendo a longa cadeia que se inicia na mineração e termina nos ferros-velhos. A idade da frota de veículos está aumentando, diminuindo o número de carros segurados e o valor dos prêmios. Escritórios, lojas e outras instalações devem diminuir os espaços físicos, reduzindo os valores em risco. E o desemprego impactará a capacidade de consumo da sociedade.
Neste cenário, é fundamental que o setor de seguros se reinvente. Com a retomada do crescimento, o médio e o longo prazo têm tudo para serem bons. A questão é como ultrapassar o agora.
Fonte: Antonio Penteado Mendonça, O Estado de São Paulo – 29/06/2020